O crescimento dos índices de criminalidade em Mariana causa inquietação entre os moradores, que enfrentam o desafio de conviver com o aumento da violência e a insegurança nas ruas da cidade
Nos últimos meses, a cidade de Mariana vive um aumento na criminalidade, especialmente pelo crescimento no número de roubos e furtos. Esta mudança de cenário vem à tona após uma comparação detalhada de dados históricos e recentes, que revela um padrão crescente de insegurança.
Dados da Secretaria de Segurança Pública de Minas Gerais, disponibilizados pelo Armazém de Dados do Sistema Integrado de Defesa Social, revelam um aumento considerável no número de furtos em Mariana, entre janeiro e junho de 2024. Comparado ao mesmo período do ano anterior, o total de furtos na cidade subiu de 270 para 328, o que representa um aumento de aproximadamente 21,48%. Já em relação aos roubos na cidade, tivemos um total de 9 casos apenas este ano até agosto, segundo o tenente Thiago Mota.
Comerciantes locais relataram à equipe do Lampião que se sentem mais inseguros e se mobilizaram para adotar medidas de autoproteção, já que muitos estabelecimentos foram assaltados em pouco tempo. Foi o que contou Gabriela do Nascimento Ferreira, sócia-proprietária de um salão de beleza da cidade, que sofreu um furto no dia 23 de junho: “Tivemos muitos gastos, mas principalmente para reforçar a segurança do nosso salão, reforçamos tudo”.
Diante dessa situação, a Associação Comercial, Industrial e Agropecuária de Mariana (ACIAM) já implementa ações há quatro meses, promovendo reuniões regulares com a Guarda Municipal, Polícia Militar, Polícia Civil, Secretaria de Desenvolvimento Social e Secretaria de Segurança Pública. No dia 7 de agosto de 2024, a ACIAM organizou mais uma reunião no Centro Convenções da cidade para discutir o aumento dos roubos e furtos nas lojas do centro. O encontro contou com a presença de mais de 20 empresários locais, e a discussão girou em torno da elaboração de estratégias e medidas para fortalecer a segurança e combater os furtos que afetam o comércio local.
Apesar dos esforços da Polícia e da Guarda Civil, Gabriela expressou que se sente cada vez mais insegura: “O roubo impactou significativamente a minha percepção de segurança na cidade, especialmente porque ocorreu às 2h48 da manhã. Os assaltantes quebraram a porta de vidro e deixaram o salão aberto até às 6h. Durante esse intervalo, não passou nenhuma viatura para fazer uma vistoria nas ruas, nem houve qualquer medida de segurança para garantir que a cidade estivesse protegida.” Uma comerciante, que preferiu não se identificar, também teve os vidros de sua loja de artigos para festa destruídos durante um furto ocorrido na madrugada de 18 de julho. Localizada em rua próxima e a apenas cerca de 210 metros do posto da Guarda Municipal, o crime não foi impedido. Ela conta que o maior prejuízo foi de aproximadamente 2 mil reais para o conserto dos vidros, além dos 132 reais em dinheiro que os bandidos levaram.
Na última quarta-feira, (21/08), a Câmara Municipal de Mariana sediou uma reunião solicitada pelos vereadores Ronaldo Bento, Pedro Ulisses Coimbra e Juliano Vasconcelos, através do requerimento nº 61/2024, para discutir sobre o alto índice de furtos na cidade, e contou com a participação do Tenente Thiago Mota, da Polícia Militar, Comandante Leonel Bráz, da Guarda Municipal, Delegado Marcelo Bangoim, da Polícia Civil e representantes das mineradoras Samarco, Vale, Cedro e da Fundação Renova.
O delegado Marcelo Bangoim apontou para uma realidade preocupante: “Viatura [para o uso da Polícia Civil] só tem uma do estado (de Minas Gerais), a outra é cedida pela guarda. Mas também não é só viatura, é do pessoal para trabalhar, principalmente do pessoal”. Além dos equipamentos, Bangoim destaca portanto o baixo efetivo de policiais civis na cidade. Como evidência da falta de investimento, Mariana ainda não possui uma delegacia especializada em casos de violência contra a mulher, embora ocupe o 5º lugar do estado de Minas Gerais em número de acionamentos da Lei Maria da Penha. A delegacia da mulher mais próxima fica em Ouro Preto, na Vila Itacolomy que, como aponta o delegado, enfrenta uma demanda menor que Mariana em relação a casos dessa natureza.
O registro de violência doméstica contra a mulher, disponibilizado pela Secretaria de Segurança Pública de Minas Gerais, também no Armazém de Dados do Sistema Integrado de Defesa Social, mostra que, entre janeiro e junho de 2023, foram registrados cerca de 47,5% de casos de violência contra mulheres. No mesmo período em 2024, a porcentagem de casos registrados foi de 43,83%, o que representa uma diminuição de 7,72%. Apesar dessa redução, o número de registros da Lei Maria da Penha na cidade continua alto.
Durante a reunião na Câmara, foi pautado o aumento da criminalidade em Mariana, com foco na relação entre esse crescimento e a população flutuante, ou seja, aqueles que vieram de fora para a cidade trabalhar nas mineradoras. Segundo o tenente Mota, com base no que diz ser os registros da polícia militar, 42% dos envolvidos em furtos na cidade são moradores de Mariana, 30% são de outras partes de Minas Gerais, 15% não puderam ser identificados, e apenas 4% são de outros estados. No caso dos roubos (que ocorrem com violência ou ameaças mais graves, diferente de furto, que não envolve violência) o tenente confirmou que 100% dos autores são de Mariana. Já uma parte significativa dos registros de crimes violentos envolvem pessoas com ligações diretas ou indiretas à mineração. O tenente Mota, da Polícia Militar, ressaltou: “Observamos um impacto muito significativo dessa população, sobretudo nos crimes violentos.”
Para o vereador Ronaldo Bento, os principais responsáveis são as mineradoras, devido ao grande fluxo de pessoas que atraem para a cidade, o que dificulta o seu mapeamento. “Então, os grandes causadores desses altos índices de criminalidade são, sem dúvida, as mineradoras, especialmente a Fundação Renova, que emprega hoje quase 9.000 homens em nossa cidade", afirmou o vereador.
A cidade, que abriga cerca de 61.387 pessoas, conforme o último Censo do IBGE de 2022, também conta com mais uma população flutuante de aproximadamente 35 mil habitantes (Folha de São Paulo), e não suporta esse volume de pessoas com as condições que possui, como o policiamento para manter a segurança pública. Ana Cristina, diretora da ACIAM conta que o policiamento oferecido hoje em dia é efetivo, mas não o suficiente para a quantidade de pessoas que vivem hoje em Mariana: “Devido ao número de pessoas que a gente tem na cidade hoje, que é muito maior do que antes, a gente percebe eles (policiais) muito sobrecarregados, mas sempre muito dispostos”.
Em resposta ao Lampião, as autoridades locais afirmam que aumentaram suas ações para conter o crescimento da criminalidade. A Polícia adota medidas de reforço na vigilância , aumentando o número de veículos policiais em bairros como Centro e Barro Preto, que são alvos recorrentes de denúncias, como afirma o Comandante da Guarda Civil Municipal, Leonel Bráz: “Aqui no centro estão acontecendo muitos crimes de furto, como está relatado em todas as redes sociais. Naturalmente, vai haver mais policiamento na área central da cidade. Agora, se outro bairro tem muitos crimes e muitos chamados, isso acende um alerta, vamos dar uma olhada nesse bairro para que possamos criar novas estratégias e prevenir crimes por lá.”
Ao ser questionada sobre quais são as expectativas da Segurança Pública para a diminuição da criminalidade nos próximos meses, a Secretária de Segurança Pública, Marta Guido afirmou: “O trabalho executado pelas instituições que cuidam da Segurança Pública em Mariana é muito forte e comprometido, apesar de vários fatores que influenciam negativamente para a execução dessas ações, como por exemplo, o crescimento da população flutuante, que impacta diretamente na prestação de serviços. É preciso reafirmar que o fortalecimento da segurança pública está ligado à construção de políticas públicas de Segurança Pública”. Marta também destacou outras medidas importantes, como a finalização do concurso da 4ª Turma da Guarda Civil Municipal (GCM), a realização do Curso de Formação para 33 novos guardas, além da participação dos GCMs em cursos de aperfeiçoamento operacional.
A comunidade permanece em alerta, unindo esforços, como por exemplo a participação dos comerciantes na Rede de Proteção Preventiva, parceria entre a PM e a ACIAM, este trabalho visa orientar os comerciantes sobre como proceder caso percebam a presença de alguém que possa vir a praticar roubos e furtos. Além disso, a rede é uma forma de os comerciantes trocarem informações sobre pessoas suspeitas, ao mesmo tempo, a Polícia Militar oferece dicas e orientações por meio de consultorias individuais para cada comerciante.
O Jornal Lampião tentou contato com a Polícia Civil e a Polícia Militar para obter os dados exatos sobre o número de crimes registrados em Mariana, mas não recebemos resposta até a data desta publicação. Também solicitamos um ofício para acesso a essas informações, porém, até o fechamento desta matéria, não obtivemos retorno.
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