Ao contrário de outras cidades da região, Mariana possui uma redução significativa ao longo dos anos nos atendimentos em saúde bucal importantes para o acompanhamento das gestantes.
A relação entre a saúde bucal e a saúde geral é muito importante, especialmente durante a gravidez. Nesse período, mudanças hormonais podem aumentar a vulnerabilidade das gestantes a problemas odontológicos, destacando a necessidade de cuidados específicos para garantir uma gestação saudável.
Assim, o pré-natal odontológico, criado em 2019, é um serviço fundamental no cuidado integral da gestante. Instituído como parte das diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS), esse atendimento busca prevenir e tratar doenças bucais que podem afetar tanto a mãe quanto o bebê. Sua importância reside na prevenção de complicações como gengivite gravídica e cáries, além de reduzir o risco de parto prematuro e baixo peso do bebe ao nascer, condições que são associadas a infecções bucais. Entretanto, em Mariana observa-se, a partir de uma análise da linha histórica desse serviço essencial, que houve uma redução de 30%, em 2022, para 25% de números de gestantes atendidas no primeiro quadrimestre de 2024. Essa queda preocupa os profissionais da saúde porque não ter acompanhamento odontológico da pessoa gestante pode trazer perigos ao desenvolvimento do bebe se estiverem com infecções na boca não tratadas.
O pré-natal assegura que as pessoas gestantes recebam orientações sobre higiene bucal, dieta adequada, e cuidados específicos, com vistas a uma gestação mais saudável. A implementação desse atendimento demonstra uma compreensão crescente da interdependência entre a saúde bucal e a saúde geral, sublinhando a importância de um cuidado integral e acessível para todos.
Em entrevista cedida ao Lampião, Fabíola Rolim, dentista responsável pelo acolhimento e primeiro atendimento às gestantes no programa na sede do pré-natal odontológico, localizada na Policlínica Municipal de Mariana no Bairro Barro Preto, enfatizou a importância do acompanhamento odontológico para gestantes. Segundo ela, "o acompanhamento da saúde bucal é extremamente importante durante essa fase de vida da mulher", destacando a influência direta na saúde geral da paciente e potenciais complicações como parto prematuro.
Para serem atendidas, Fabíola explica que "toda gestante tem o direito de fazer o pré-natal odontológico", sendo encaminhada preferencialmente pelo médico da unidade de saúde. Caso não ocorra o encaminhamento, a gestante pode procurar diretamente por essa assistência.
Nas orientações de higiene bucal, é recomendado cuidados diários como escovação e uso de fio dental, enfatizando que mudanças hormonais durante a gestação aumentam o risco de problemas como gengivite e periodontite.
Outro impacto do acompanhamento odontológico na saúde do bebê diz respeito à detecção e tratamento de infecções. A profissional também enfatiza a necessidade de avaliação individual, garantindo que todos os casos devem ser tratados com a devida atenção, considerando condições de saúde específicas das pessoas gestantes.
A dentista destaca a importância do programa também para a conscientização sobre a relevância da saúde bucal, especialmente em uma fase da vida muitas vezes negligenciada. Muitas vezes a gestante passa todo o período da gravidez com alguma infecção sem ser tratada por pura desinformação. “Às vezes a gente se esquece, mas uma infecção na boca é uma infecção como em qualquer outra parte do corpo. A gestante quando ela tem algum tipo de infecção… uma infecção de urina, outra que seja, ela não vai se automedicando. Ela fica preocupada, mas ela vai ao médico e ela trata a infecção.”
Em Mariana, o serviço está disponível em diversas unidades odontológicas do município, como no Cabanas e em Passagem, além da Policlínica no Bairro Barro Preto, o que facilita o acesso das gestantes aos cuidados necessários. Basta a paciente ir até a UBS de referência de seu bairro para ser encaminhada pelo médico obstetra para o tratamento odontológico.
Esse tipo de encaminhamento visa aumentar a adesão ao pré-natal odontológico, que atualmente "ainda não é satisfatória (...) adesão ainda baixa e isso não é uma característica só do nosso município. Se você for pegar estudos, está no nível nacional. E aqui, não sei se chegamos a 30%”, diz Fabíola. Dados do Sistema de Informação em Saúde para a Atenção Básica (SISAB) revelam queda no número de pacientes atendidas no (PNO) Pré-Natal Odontológico, a meta do serviço é alcançar entre 70% e 80% das gestantes do município, abrangendo diversas comunidades do município e distritos que não possuem unidades odontológicas.
A paciente Letícia Felix, 27 anos e dona de casa, compartilhou sua experiência com o pré-natal odontológico durante a gestação e os impactos após 10 meses do nascimento da filha. "Sim, fiz o acompanhamento mais para o final da gravidez, por volta dos 7 meses. Me ligaram e agendaram um horário para eu vir ter a conversa mesmo", revela Letícia ao ser questionada sobre como descobriu o serviço, indicado pelo obstetra. Sobre os benefícios do acompanhamento para a higiene bucal da filha, Letícia destaca que "ajuda, ainda mais que minha filha com 2 meses já nasceu o primeiro dentinho e tive que começar desde cedo a fazer a higienização na boquinha dela." Quanto ao acompanhamento pós-nascimento, Letícia menciona que, por enquanto, segue apenas as orientações do pediatra, sem um acompanhamento odontológico específico.
A usuária explica que só ficou sabendo do serviço do pré-natal odontológico através da orientação do médico do PSF local, que a incentivou a agendar consultas. "Para mim foi ótimo, tanto que estou fazendo tratamento até hoje", comenta.
O mesmo aconteceu com Rayane Barbosa, de 30 anos, estudante do curso de Serviço Social da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) e auxiliar de escritório. A usuária do serviço de pré-natal odontológico está grávida de 4 meses e foi apresentada ao serviço através da agente de saúde de seu posto de referência em Passagem - distrito de Mariana."A agente entrou em contato comigo pelo WhatsApp e falou que eu precisava começar a fazer esse acompanhamento odontológico porque era de praxe mesmo. Todas as gestantes começam a fazer esse acompanhamento", conta Rayane.
Durante as consultas odontológicas, Rayane recebeu orientações detalhadas. "A dentista no primeiro dia que eu fui pediu todos os meus dados, fez tipo uma triagem e nesse mesmo dia eu já fui examinada (...) ela viu que eu precisava de uma limpeza mesmo. Aí ela já foi me dando algumas orientações e no dia que eu fui fazer ela já me deu orientações também para o cuidado do dia a dia, de escovação, de passar fio dental e até do próprio bebê também quando nascesse. Ela já deu as orientações para os primeiros dias de vida dele, de cuidar da gengiva e essas coisas", relata.
No entanto, Rayane não recebeu o acolhimento como é divulgado no programa, com a palestra inicial dada pelos dentistas. "Foi só no consultório. A partir do momento que ela foi me examinar, ela ficou conversando comigo e me perguntando se já tive algum problema nos dentes, na boca.”
Ela relata que não conhecia o programa de pré-natal odontológico: "Achava que era só pré-natal com o médico. Depois que a agente de saúde entrou em contato comigo, percebi a importância. Como ela me falou, dependendo do que a gente tiver, algum problema na boca, no dente, se tiver alguma bactéria… isso pode ir para a corrente sanguínea e chegar até o bebê. Aí a partir daí eu fui ver que realmente é muito importante esse acompanhamento odontológico na gravidez."
Baixa Adesão ao Pré-natal Odontológico no Brasil: Análise de Dados Recentes
Em relação à adesão ao programa, Fabíola Rolim reconhece que ainda é baixa, citando que preocupações associadas a tabus de senso comum sobre grávidas, como não poderem se consultar com dentista em razão do uso de medicação, anestesia ou exame de raio-x, atrapalha a procura pelo atendimento.
Os dados do Sistema de Informação em Saúde para a Atenção Básica (SISAB) mostram que apesar, das iniciativas de campanha do Sistema Único de Saúde (SUS) e de iniciativas como de Fabíola Rolim diminuir a falta de adesão ao pré-natal odontológico, acaba sendo um desafio para os dentistas que estão à frente do programa e junto aos médicos da Atenção Primária à Saúde (APS) e permanece com baixo fluxo de paciente. A análise dos últimos quadrimestres, na Região dos Inconfidentes mostra variações expressivas na queda da adesão ao serviço, tanto em nível nacional quanto regional.
Em 2022, a adesão ao pré-natal odontológico no Brasil foi de 44% no primeiro quadrimestre, aumentando para 51% no segundo e 53% no terceiro. Em 2023, os números seguiram uma tendência de crescimento, alcançando 58% no primeiro quadrimestre, 62% no segundo e 59% no terceiro. Em 2024, a taxa de adesão manteve-se praticamente estável, com uma pequena queda em relação ao período anterior, 59%.
Em Minas Gerais, os índices foram inferiores à média nacional, mas também mostraram crescimento. No primeiro quadrimestre de 2022, a adesão foi de 40%, subindo para 45% no segundo e 48% no terceiro. Em 2023, a adesão foi de 56% no primeiro quadrimestre, 59% no segundo e apresentou uma ligeira queda, para 54% no terceiro. No primeiro quadrimestre de 2024, houve um aumento pouco expressivo para 55%. Se compararmos os dados estaduais com os índices do país, veremos que Minas se manteve bem próxima deles a partir de 2023, com pequenas diferenças para baixo de somente 2% a 5%.
Já na Região dos Inconfidentes, observa-se que os dados de Itabirito, Ouro Preto, Ouro Branco e Mariana apresentam um cenário variado na adesão ao pré-natal odontológico (PNO), com somente Mariana demonstrando uma queda robusta do alcance do programa ao longo dos anos.
Adesão ao Pré-natal Odontológico na Região dos Inconfidentes (2022-2024)
Enquanto algumas cidades, como Ouro Branco, mostram uma melhora contínua, saindo de 5%, em 2022, e alcançando 60% no primeiro quadrimestre deste ano, Mariana passou de 30% a 25% no mesmo período. Itabirito iniciou 2022 com 20% de adesão, e mais recentemente, também no primeiro quadrimestre de 2024, a adesão subiu para 42%. Ouro Preto também demonstrou crescimento, de 14% para 31%. Os dados refletem uma disparidade significativa na adesão ao pré-natal odontológico nesta região. Contudo, a adesão ao serviço ainda enfrenta desafios significativos. Em entrevista à Policlínica de Mariana, a gerente da unidade, Simone de Oliveira, 39 anos, mencionou que a queda se deve, em parte, a problemas tecnológicos do sistema de dados da unidade que impediram o registro adequado durante dois meses no município. Questionada sobre a falta de sistema e a demora para ser consertado, e a ligação com a baixa adesão, a mesma se recusou a dar mais detalhes.
Já de acordo com Vânia Godoy, coordenadora do setor de Odontologia na sede (Policlínica), situada no Bairro Barro Preto, e coordenadora do programa sobre o serviço público do pré-natal odontológico, diversos fatores têm contribuído para a baixa adesão das gestantes ao PNO. A profissional cita que uma pesquisa realizada em parceria com a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) - Faculdade de Odontologia - e a Prefeitura de Mariana em 2024, identificou vários obstáculos, incluindo os mitos e crenças sobre o atendimento odontológico já exemplificados acima. Além disso, o desconhecimento da existência do PNO (Pré-natal Odontológico), a falta de encaminhamento pelas Equipes de Saúde da Família (ESF), a ausência de consultório odontológico na Unidade Básica de Saúde (UBS) em alguns bairros e distritos.
Estratégia para aumentar a conscientização
Para enfrentar esses desafios, a equipe odontológica tem adotado diversas estratégias para aumentar a conscientização e adesão das gestantes ao serviço. "Estamos utilizando as mídias sociais da prefeitura de Mariana, que se encontra indisponível desde de 06 de julho à 06 de outubro, por conta do período eleitoral do município. Para divulgar o programa e realizamos grupos operativos para gestantes de forma mensal", explicou Vania Godoy, coordenadora do programa de pré-natal odontológico.
Além disso, para melhorar ainda mais a adesão ao serviço estão sendo planejadas outras ações e programas específicos. Vania Godoy destacou que, além de uma oficina já realizada na presença de profissionais de saúde e conselheiros municipais de saúde, será ofertado um curso de capacitação para os profissionais de saúde da Atenção Primária à Saúde (APS) sobre o PNO.
Com esforços contínuos de conscientização e capacitação, espera-se que a adesão ao serviço aumente, garantindo uma gestação mais saudável para todas as gestantes do município.
Benefícios do Pré-natal Odontológico
Os benefícios do pré-natal odontológico são significativos. Gestantes que participam do programa demonstram mudanças de comportamento em relação aos cuidados da saúde bucal, não só para si mesmas, mas também para desenvolvimento de bons hábitos no futuro do bebê, Vânia enfatiza que esse cuidado integral é essencial para prevenir complicações futuras. Para ter acesso ao Pré-Natal Odontológico no Sistema Único de Saúde (SUS), a gestante deve buscar orientações nas unidades de saúde mais próxima de sua residência e solicitar o agendamento das consultas com as equipes de saúde bucal. Após isso a gestante será encaminhada para uma das Policlínicas de Mariana, Barro Preto ou Cabanas.
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