Sem projetos públicos relacionados à modalidade desde o início de 2024, atletas e demais praticantes do esporte se veem sem perspectivas na esfera local
Em Mariana, a prática de basquete teve ampla ascensão após o período da pandemia, mas enfrenta um grande desafio em 2024: a falta de investimentos públicos. Desde o início do ano, a modalidade foi deixada de lado nos projetos públicos relacionados ao esporte. O “Educar pelo Esporte”, por exemplo, foi um projeto criado pela Prefeitura de Mariana, por meio da Secretaria de Esporte e Lazer, e que funciona ativamente desde 2022. Com o intuito de promover a prática esportiva diária para a população, oferece aulas de futebol, futsal, ginástica, handebol, judô, treinamento funcional e vôlei, mas não de basquete.
Na categoria sub-17 de basquete, a Escola Estadual Dom Silvério, de Mariana, sagrou-se campeã durante a etapa microrregional do JEMG 2023 (Jogos Escolares de Minas Gerais). Esta poderia ter sido a oportunidade para incentivar a prática no município, mas a realidade ficou bem distante disso. Desde o segundo semestre do ano passado, quando a Arena Mariana, principal espaço de práticas esportivas, foi interditada por insegurança relacionada à má qualidade de seu piso, os atletas locais se depararam com um grande empecilho: a inadequação das quadras da cidade para a prática do esporte e a grande necessidade de manutenção nos locais.
Marcos Antônio de Paula, de 18 anos, atleta de basquete e que fazia parte da equipe campeã da etapa microrregional do JEMG de 2023, relata alguns dos problemas enfrentados nas quadras de Mariana: “O chão é horrível, horrível para o basquete. Às vezes não tem suporte, nem tabela também. Se você vier aqui na quadra da Chácara, você vai ver que a quadra de futsal é coberta e a do basquete, que nem é de basquete, é poliesportiva, é aberta. Além disso, se você olhar na de basquete, você vai ver só uma luz que funciona. O que mais ilumina a quadra de basquete são as luzes da quadra de vôlei de praia.”
Mesmo com a reforma ocorrida em 2024, a Arena Mariana não pôde voltar a receber o basquete. Como a reforma foi uma parceria com o Cruzeiro Futsal para que o time pudesse sediar jogos do campeonato brasileiro no local, as marcações e o tamanho da quadra foram adequados respeitando as medidas exigidas pela Confederação Brasileira de Futsal (CBFS). Caso as medidas e marcações fossem alteradas para a múltiplas práticas e englobar mais esportes, o contrato previa a cobrança de multas.
Avelino Silva, assessor técnico do secretário de esportes de Mariana, Gustavo Gomides, afirmou que apenas agora, quase um ano depois da primeira interdição da Arena, é que as marcações poliesportivas serão refeitas. Entretanto, ainda assim, a volta da prática do basquete não está garantida, devido à adaptação do modelo das tabelas ao novo piso da arena. “A nossa tabela é aquela tabela de empurrar. Ela é muito pesada e o piso, como é aquele piso modular, é mais frágil pra você empurrar a tabela em cima dele. Então eu não sei como é que a gente vai fazer essa logística para trabalhar com a tabela em cima. Mas não é que não pode usar”, afirmou o assessor técnico.
Desde 2012, quando foi fundada a Associação de Basquete Marianense (ABM), foram realizadas algumas iniciativas para o desenvolvimento da modalidade, como a criação de categorias de base, treinamentos para atletas juvenis, treinos para adultos e o Torneio de Basquete 3x3, que começou em 2016 e foi realizado anualmente até 2019.
A co-fundadora da associação, Priscilla Tukoff, explicou que, ao longo desses anos, a Prefeitura de Mariana contribuiu com algumas necessidades da ABM, como equipamentos, alimentação, arbitragem, premiações para os eventos e cessão de espaços para treinos. Entretanto, raramente houve iniciativa do Município em relação à modalidade: “a Prefeitura, teoricamente, apoia, mas não apoia. Ela apoia se a gente der 80% dos passos, aí ela vai lá e dá os 20% que estão faltando. É assim que funciona”, conta.
Sem um treinador direcionado para a modalidade, desde o final de 2023, na Secretaria de Esportes e Eventos, o basquete local, principalmente as categorias de base, se vê sem projetos públicos e perspectivas futuras. No ano de 2024, por exemplo, das 49 bolsas aceitas pelo Bolsa Atleta, programa organizado pela Secretaria responsável por contribuir para a valorização das práticas esportivas, nenhuma foi direcionada ao basquete. A bolsa por atleta pode chegar a quase mil reais, conforme critérios estabelecidos pela Lei nº 2.025/2006.
A Secretaria de Esportes de Mariana acredita que o declínio da modalidade não tem relação com a falta de apoio público ou com a má estrutura dos espaços esportivos. Avelino Silva diz que a região sofre com a falta de profissionais capacitados para a modalidade e afirma não ter uma previsão para novas contratações. “Talvez o basquete tenha tido essa queda por falta de mão de obra. Porque, assim, a gente tem vários profissionais de educação física, muita gente formando, mas ninguém específico nessa área.”
O assessor ainda afirma que a possibilidade de futuros projetos relacionados à modalidade dependem desse profissional especializado no basquete ser contratado pela Prefeitura. “Se a gente tiver mão de obra e alguém que queira, porque a pessoa também tem que ser proativa, né? A pessoa tem que entrar e querer fazer acontecer. Se tiver um profissional qualificado que queira fazer acontecer e tenha a oportunidade de entrar na secretaria e estar trabalhando conosco, eu acredito que tem tudo para dar certo”, afirma.
Porém, a falta de perspectiva para o futuro do esporte em Mariana foi um dos principais motivos para Victor Augusto Rodrigues, 26 anos, último professor de basquete contratado pela Prefeitura de Mariana, deixar o cargo no início deste ano. Segundo ele, estar em uma secretaria que não consegue desenvolver o esporte em que ele é especialista, o desmotivou a continuar no cargo: “Uma adequação mínima de quadra mesmo a gente não conseguiu ter. O espaço que a gente tinha era aberto ao sol. Como é que eu vou colocar uma criança pequena para ficar no sol da tarde, por exemplo?”, questiona o professor.
Após deixar o projeto da Prefeitura, Victor decidiu começar a própria escolinha de basquete, oferecendo aulas em um clube privado da região para jovens de até 18 anos. Existe uma taxa para participação, mas espera-se que até o final de 2024 haja um patrocínio para tornar a oferta isenta de pagamento e, assim, alcançar todos os jovens de Mariana interessados pelo basquete.
Nesse novo ambiente, Victor encontra estrutura suficiente para suas aulas, diferente das tabelas tortas, marcações com tamanhos errados, falta de iluminação, falta de cobertura e pisos extremamente desgastados das instalações públicas. Junto a essas incoerências que dificultam e prejudicam a prática do basquete nas quadras de Mariana, a ausência de iniciativas voltadas para a modalidade, contribui para o declínio de um esporte que, apesar de ter uma significativa quantidade de entusiastas e praticantes na região, vê sua popularidade e potencial frustrados.
A situação atual revela a necessidade de uma reavaliação das políticas esportivas locais e de um compromisso renovado com o desenvolvimento de modalidades. Sem uma intervenção concreta e uma visão estratégica, o basquete marianense continuará a enfrentar um futuro incerto, sem perspectivas de recuperação e crescimento.
Curiosidade
O basquetebol é uma modalidade com mais de 100 anos no Brasil, mas que ainda apresenta dificuldades para incentivo da prática. A chegada do esporte ocorreu em 1896, quando o estadunidense Augusto Shaw, professor da Universidade de Yale (Connecticut) foi convidado a dar aulas na Universidade Presbiteriana Mackenzie, em São Paulo e, junto, trouxe o esporte, que rapidamente foi disseminado por todo o país, principalmente a partir dos anos 90, quando se popularizou pelo mundo inteiro com a ascensão da seleção estadunidense, o “Dream team” e do atleta Michael Jordan.
Desde então, em todo o território nacional, o esporte é deixado em segundo plano em relação ao futebol, tanto em termos de investimentos, quanto de incentivos. Um exemplo claro ocorreu com a seleção masculina nos Jogos Olímpicos de Paris 2024, quando, por falta de patrocínios e financiamento, o treinador Aleksandar Petrovic assumiu a equipe voluntariamente 3 meses antes da competição.
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