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Ribeirão do Carmo é contaminado por soda cáustica

  • Camila Nakashima e Cecília Quadros
  • 20 de ago.
  • 5 min de leitura

46ª edição


Ouça a notícia na íntegra:


Após mortes de animais e impactos à população ribeirinha, Prefeitura de Mariana informa que análises do SAAE indicam melhora na qualidade da água.


#ParaTodosVerem: Um caminhão-tanque tombado de lado na pista que apresenta marca de líquido escorrido. À esquerda, um bombeiro em uniforme laranja e, à direita, dois militares verificam a cabine do caminhão.
Acidente com caminhão-tanque, no km 94 da BR-356 em Ouro Preto, causa derramamento de soda cáustica na via e atinge Ribeirão do Carmo. | Foto: Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais

Na segunda-feira, dia 11 de agosto, um acidente envolvendo um caminhão-tanque obstruiu a BR-356, próximo à região do bairro Saramenha, em Ouro Preto. A carreta transportava uma carga de soda cáustica que se espalhou pela estrada no início da tarde, causando transtornos não só para o trânsito, mas provocando graves consequências para o meio ambiente e para os moradores da região de Mariana.


O veículo transportava cerca de 19 mil litros de soda cáustica líquida e o derramamento causou preocupação nos órgãos públicos após o reagente atingir o curso d’água do Ribeirão do Carmo. Com a atenção da Prefeitura de Mariana, Defesa Civil, Guarda Municipal Ambiental, Instituto Habitat e Núcleo de Emergência Ambiental (NEA), estão sendo realizados constantes monitoramentos da qualidade da água. Orientações vêm sendo divulgadas nas redes sociais com instruções para que a população não entre em contato com o rio e não utilize sua água para tratamento de animais.


O recolhimento da soda cáustica no local do acidente e proximidades foi realizado pela empresa Ambipar, que atua em emergências ambientais. André Machado, agente de proteção da Defesa Civil, afirmou que, no primeiro momento após o acidente, as pessoas que moram ao longo do leito d’água foram orientadas pessoalmente e, posteriormente, também por meio das mídias sociais. “A Defesa Civil do município de Mariana fez contato com a equipe da Guarda Municipal, com o Núcleo de Emergência Ambiental (NEA) e a Secretaria de Meio Ambiente também para tomarem as medidas necessárias”, comentou André. 


O Instituto Habitat, empresa de defesa ambiental e proteção animal, junto com a Secretaria do Meio Ambiente, tem feito o resgate de animais ao longo do curso do rio e continuam realizando estudos para mensurar o quanto a fauna foi afetada. A equipe veterinária afirma que foram encontrados muitos animais sem vida e outros com dificuldades motoras e queimaduras causadas pelo contato com a soda. 


Outro agravante que impede o Instituto e demais órgãos de minimizar e mensurar precisamente os impactos do acidente é a extensão do rio, que possui trechos inacessíveis ou de acesso restrito. “Difícil fazer uma afirmação, é muito cedo para determinar o trecho total que vai ser impactado. Pelo volume, a gente acredita que o trecho de Ouro Preto e Mariana até a barragem de Furquim são os que terão impacto direto mais rápido”, informa Tiago Lage, presidente do Instituto Habitat.


Poucos peixes foram retirados do rio e, ainda assim, a maioria em estado grave de contaminação. Segundo a equipe responsável, existe a possibilidade de que estes peixes resgatados não sobrevivam. Dois cães também foram encontrados com queimaduras de soda cáustica e permanecem em tratamento no Instituto, sendo que um deles ainda se encontra em estado grave.


 #ParaTodosVerem: Trecho do Ribeirão do Carmo no centro de Mariana. O ribeirão corre abaixo de uma ponte de concreto e em sua margem há vegetação. Ao fundo, vê-se casas e árvores.
O Ribeirão do Carmo atravessa a cidade de Mariana, compõe a paisagem urbana e faz parte do cotidiano da população. | Foto: Camila Nakashima

A soda cáustica é composta pelo hidróxido de sódio (NaOH) e possui uma base extremamente forte. Quando em contato com a água, a reação causa um efeito exotérmico, processo químico que resulta em uma grande liberação de calor, além da alteração do pH da água. Com a chegada do produto até o ribeirão, o risco não se restringiu apenas aos animais aquáticos, mas também a todos aqueles que vivem próximos ao rio ou que fazem uso de suas águas, sejam animais ou até as pessoas que tenham contato, mesmo que indireto. 


“A alteração do pH da água pode afetar a disponibilidade de nutrientes, a qualidade da água e a capacidade de suporte da vida aquática. Em contato com a pele pode levar a queimaduras de até terceiro grau. É importante que nesse momento os animais ou seres humanos não consumam a água”, informa Adilson Candido da Silva, professor do Programa de Pós Graduação Multicêntrico em Química de Minas Gerais na UFOP.


Conforme foi divulgado nas redes sociais do prefeito de Mariana, Juliano Duarte, e da Prefeitura Municipal, o consumo de água potável distribuído pelo Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE) não foi afetado, pois a contaminação não atingiu os reservatórios utilizados para abastecimento da cidade. A empresa coletou amostras de água no Ribeirão do Carmo para testagem e averiguação da contaminação e sua principal orientação, em especial à população ribeirinha, foi para não utilizar água do rio, nem mesmo para tratamento de animais.


A pneumologista Marina Fonseca Neves Pontes, que atua nas prefeituras de Ouro Preto e Mariana, alertou sobre os riscos da exposição à soda cáustica. Segundo a médica, o contato com a substância não provoca doenças infecciosas, mas pode causar agressões químicas ao sistema respiratório, variando de irritações nas vias aéreas, tosse persistente e sensação de sufocamento, até quadros mais graves, como bronquite química e lesões pulmonares inflamatórias. 


“Recomendo evitar a exposição até a liberação oficial. Não consumir água ou alimentos da região até testes confirmarem segurança. Fechar portas e janelas se houver cheiro irritativo perceptível. Procurar atendimento médico imediato se houver tosse persistente e irritativa, falta de ar ou chiado no peito, ardência intensa no nariz, garganta ou olhos e sensação de sufocamento", reforça Marina.


Gilane Gazzeta, moradora do bairro Cristal, próximo ao Ribeirão do Carmo, em Mariana, relatou ter percebido mudança na água logo após o acidente. Ela observou a presença de espuma visível e um cheiro forte vindo do exterior, forçando a moradora a manter a casa fechada. “Meu vizinho já é de idade e não tem redes sociais, ele ficou sabendo pela minha boca. Eu senti um cheiro muito forte, olhei a notícia e falei para ele, porque ele tem dois cachorros que vivem ali na beirada do rio. Deveriam vir aqui avisar para as pessoas que moram principalmente na beira do rio”, disse a moradora.


Segundo o químico Adilson Candido, a tendência é que a contaminação se dilua com o tempo à medida que o volume de água do ribeirão vá dissipando os efeitos causados pelo derramamento da soda cáustica. Porém, na terça-feira, 19 de agosto, o prefeito de Mariana usou as redes sociais para atualizar a população sobre a situação do Ribeirão do Carmo. Ele informou que o SAAE, após análises concluídas, apontou que a água voltou à normalidade. A última coleta, até o momento, foi feita no dia 18 de agosto às 11h22. “Dentro do resultado esperado, a água hoje já encontra-se em condições de utilização pela população ribeirinha para tratamento e cuidado de animais”, indica Juliano Duarte.


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